Pular para o conteúdo principal

Abordando à alegria transcendental na revelação

 

A alegria (chara) é uma virtude que compõe os valores do reio de Deus e a ética da comunidade espiritual de Jesus. Essa alegria é centrada na manifestação do Evangelho que é a faceta experimental da aliança da graça. No Novo Dicionário  de Teologia Bíblica, T. Desmond Alexander e Brian S. Rosner descrevem a alegria, no contexto da nova aliança:  A alegria é característica da vida de fé; delimita tanto a comunidade como o indivíduo. A alegria é uma qualidade, não simplesmente uma emoção, da qual Deus é tanto objeto (Sl 16.11; Fp 4.4) quanto o doador (Rm 15.13). (Novo Dicionário de Teologia Bíblica, São Paulo, SP, Vida, 2009, p.568)

Nessa forma de entender a alegria, ela se torna uma realidade existencial e vivencial indispensável no existir-no-mundo dos discípulos de Cristo (Fp 4.4). Ser alegre preenche o roteiro existencial daqueles que foram chamados pela aliança redentiva. Essa alegria é resultado da união de Jesus conosco quando por fé recebemos no Evangelho os efeitos e implicações de sua expiação, do seu sacrifício substitutivo, uma delas foi a experimentação do amor divino que gera a vivenciação do amor de Jesus que nos remete a percepção subjetiva dessa alegria transcendental que Jesus, qualifica de completa (plêrõthê): 9 Assim como o Pai me amou, Eu da mesma forma vos amei. Permanecei no meu amor. 10 Se obedecerdes aos meus mandamentos, permanecereis no meu amor, exatamente como Eu tenho obedecido às ordens do meu Pai e permaneço em seu amor. 11 Tenho-vos dito essas palavras para que a minha alegria permaneça em vós e a vossa felicidade seja completa. (Jo 15.9-11). Comentando sobre esse amor que fomos inseridos escreveu D. A.  Carson: Completa pressupõe que alegria humana em um mundo caído será, na melhor das hipótese, efêmera, superficial e incompleta, até que experimentemos o amor de Deus em Jesus (Carson - 2007). Em outro lugar Jesus salienta a manifestação dessa alegria na vida dos discípulos como associado a percepção da relação de intimidade com Deus resultante das respostas as orações (Jo 16.24).

De sorte, a alegria que promana da nossa relação conectiva com a graça salvadora é indispensável para a unidade, saúde e missão da comunidade dos redimidos, dos seguidores. Vemos isso de forma muto clara nos primórdios da comunidade espiritual. Ali se percebe que essa alegria era universal e saturava todos os circuitos de afetos de maneira cotidiana e intersubjetiva formatando suas linhas afetivas e interconectivas no seu círculo de vivencia: 46 Diariamente perseveravam unânimes no templo, partiam pão de casa em casa e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de coração, 47 louvando a Deus e contando com a simpatia de todo o povo. Enquanto isso, o Senhor lhes acrescentava, dia a dia, os que iam sendo salvos. (At 2.46-47).

De onde brotava essa virtude conectiva dos afetos e emoções da comunidade da nova aliança¿ Da estrutura valorativa do reino de Deus tornado manifesto na missão de Cristo. Esse reino não pode ser encontrado nas geografias externas, mas é vivenciado na atuação executiva do Espírito Santo. Paulo o revela os contornos e traços dessa atividade no triunvirato ético aliancista da justiça, paz e alegria: 17 Pois o reino de Deus não diz respeito ao que comemos ou bebemos, mas a uma vida de justiça, paz e alegria no Espírito Santo. 18 Se servirem a Cristo com essa atitude, agradarão a Deus e também receberão a aprovação das pessoas. (Rm 14.17-18).  Essa faceta evidenciadora é destacada por R.C. Sproul: O reino de Deus (e, portanto, nossa liberdade) não é uma questão de comida e bebida, e sim das bençãos da graça (Sproul – 2022).

Visualizasse aqui o protagonismo e utilização global da alegria transcendental por parte do Espírito em todo seu per-curso  transformador na vida dos seguidores de Jesus e membros da comunidade espiritual. Isso fica óbvio, quando entendemos que essa alegria não só revela as fronteira do reino de Deus, como faz parte das manifestações do fruto (karpou) do Espírito. Dessa  lavoura espiritoexistencial que ele está produzindo dentro da interioridade de cada participante desse fenômeno redentivo, como ele realiza essa obra¿ Refundando nosso self, mergulhando na profundidade do nosso ser-em-si, de nossos sentimentos, emoções e cognição, ou seja, nas nossas questões de fundo, que nos alienam e nos definem, de certa maneira, como sujeitos (Gl 5.22-25).

Portanto, é imprescindível que à luz dessa presença massiva da alegria que brota de Jesus e nos apresenta como suas testemunhas ao mundo, como participantes dessa graça da aliança redentiva, que nos descreve como novos seres vivendo uma nova subjetividade, não melhorada, mas redimida e trans-formada possamos viver com intensidade e concretude essa alegria fluindo da agenciação do Espírito na vivenciação do Evangelho. SDG.

Rev. Marcus King Barbosa

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

The Divine Self-Revelation and the Work of the Reformed Theologian

  Our activity as public theologians fundamentally depends on theological work. This work, in turn, originates from the hermeneutical perception that God communicates with His moral creation made in His image ( imago Dei ), meaning the understanding that God has spoken to His creation. This speaking is obviously mediated ( Vermittelte ); it does not come to us in a literal divine discourse but is instead unveiled, adapted, and contextualized to our condition as creatures, to our essential limits and frailties—namely, understanding, imagination, and perception. As R.C. Sproul explained: God addresses us on our terms, and because He made us in His image, there is an analogy that provides a means of communication with Him (Sproul - 2017).   This means used by God to reveal Himself to His creation is designated by theology as revelation ( g’lâh, apokalypsis, phanêrosis ). Revelation is, therefore, the way God unveils or reveals Himself (epistemology) to His creation in what i...

Jesus o criador

  Cristo como o filho eterno gerado por Deus/Pai é parte de uma relação divina que foi designada na tradição teológica cristã de a trindade, ou triunidade divina. Nessa correlação dentro da ontologia que inclui o Espírito Santo ( Ruash L’Qadosh ) todos possuem a essência divina ( ousia ) distinta em modos de subsistência ou pessoalidade (personas). Esse entendimento foi bem firmado em um símbolo confessional antigo, o credo de Atanásio e inserido dentro do Livro de Concórdia, documento confessional Luterano: E a fé católica consiste em venerar um só Deus na Trindade e a Trindade na unidade, sem confundir as pessoas e sem dividir a substância. Pois uma é a pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo; mas a divindade do Pai, do Filho e do Espírito Santo é uma só –igual em glória, coeterna em majestade (Livro de Concórdia, São Leopoldo, Porto Alegre, Concórdia/Sinodal, 2023). Vemos também essa confissão de uma visão trinitária de Deus em outro credo confessional, A Fé ...

SOMOS UMA GERAÇÃO DIGNA DE LAMENTO

Penso que somos uma geração que até o momento não provamos do poder real do Evangelho da graça. Não me compreendam mal, não estou dizendo que não temos um conhecimento intelectual e teológico   das doutrinas da graça, não estou também afirmando que não temos milagres, conversões, nem tão pouco estou sugerindo que não temos um grande império religioso com nosso templos abarrotados de fieis. Fazer uma declaração assim seria contrario senso, o que estou tentando delinear é que até então somos uma geração espiritualmente pobre de uma verdadeira experiência com o poder da graça do Deus trino como tornada disponível no Evangelho de Cristo (Tt 2.11-13). Você deve estar indagando por que ele diz isso? E tem toda razão de assim fazê-lo visto que essa é uma declaração ousada e comprometedora pelo seu conteúdo. Então por que estou fazendo isso? Bem minha afirmação não é arbitrária, mas resultado de uma reflexão madura e profunda do próprio Evangelho como quando confrontado com a prá...