Sou pastor Batista Reformado e assistindo ao debate no pragrama Vejam só, fui provocado a responder a varias colocações que foram feitas pelo pastor Paulo Henrique. Minha considerações seguem o o seguinte recorte:
Primeiro
equívoco do pastor Paulo de tentar enunciar a extensão da expiação por meio do
chamado “universal” como se ele explicasse a ilimitabilidade da expiação. Por
quê? Porque ele não elucidou que na revelação bíblica o chamado é de dupla
natureza, o chamado externo de natureza instrumental e agenciatório e o chamado
interno exercido pelo Espírito que é habilitador e eficiente porque implica na fé
salvífica e como já visto o trabalhar do Espírito (At 16.14: Kyrios
diênoikse: Abriu o Senhor; At 2.37: katenúgêsan, verbo
indicativo aoristo passivo: sofreram apunhaladas; Ef 1.13:pisteúsantes:
verbo particípio aoristo, crendo sempre do modo completo). Esse chamado interno
é eficaz, não é genérico, mas importa na ingerência pessoal do Espírito e, por
questões claras, não pode ser universal, visto que o Espírito não realiza essa
obra universalmente. Além disso, o uso de Mateus 11.28 diz muito, prova pouco,
no tocante a expiação ilimitada porque ele é ético em seu significado, não é
uma avaliação teológica dos limites do chamado para ir a Jesus, mas destaca
apenas o que se deve fazer, ou seja, vir a Cristo. Todos precisam responder ao
convite do Evangelho de Jesus, a questão é quem responde eficientemente. Aqui
fica patente que o pastor não domina os sentidos hermenêuticos dos textos
bíblicos: ético, prático e teológico. Pois, quando o autor revelacional quis
tratar dessa extensão, desse limite do chamado ele usa o sentido teológico
próprio (Jo 6.44). No texto ele finca o sentido de quem pode: “44Pois
ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer a mim”. Isto
é, quem o Pai enviar. Não há afirmação mais desenganadora da expiação
ilimitada, universal do que essa. Acrescento ainda que o termo trazer, usado no
texto, no original traz o sentido, o significado de uma atração irresistível (elkúsê: verbo subjuntivo
aoristo ativo: puxar, arrastar, atrair). Vejam os correlatos onde esse verbo é
usado ( At 21.30; Tg 2.6). Dessa forma, se o chamado for percebido em seu
sentido completo ele não aponta para a expiação ilimitado, mas seu inverso,
visto que só respondera a este chamado de modo redentor quem foi enviado pelo,
pai e arrastado pelo poder e glória de sua graça.
Em segundo lugar o
“professor” de grego lê o texto João 3.16 no original, mas não elucida o
sentido multiforme do termo que ele se fundamenta, no caso todos (pâs,
pántes) deixando para a audiência a ideia de que ele significa apenas
todos sem exceção. Porém, pâs e pántes trazem o
significado não apenas de totalidade sem exceção, mas sem distinção ou
discriminação e o seu sentido só pode ser estabelecido no contexto, ou seja, a
totalidade que o termo todos apresente sempre dependerá da contextura que ele
estará inserido. Como exemplificação vejam textos onde o sentido não é de
totalidade sem exceção (At 4.21 aqui se refere só aos crentes; At 21.28, aqui
uma multidão, não a totalidade da raça humana; Mt 4.23, aqui tipos
indiscriminados de doenças e não a totalidade das doenças). Entendendo essa
diferenciação grega para o termo todos, vamos para João: 16 Porque Deus amou o
mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê
não pereça, mas tenha a vida eterna (Jo 3.16). O termo todos (pâs)
aqui avaliando-se o contexto se relaciona com os crentes, todos os crentes, não
todos os integrantes da humanidade. Essa verdade se torna mais liquida nos
textos que se seguem, pois, o todo e o mundo são restringidos aos que amam a
luz e praticam a verdade (vs-19-29).
Há ainda o uso fora de
esquadro hermenêutico do texto de 1 Pedro 3.18, onde o termo os injustos (adíkõn)
é utilizado de forma eisegética pelo pastor para corroborar a tese da
expiação ilimitada. Por que afirmo isso? Porque Pedro usa o termo numa
aplicação alusiva, nada indica na perícope que o propósito do autor seria
discutir os limites da expiação, da obra de Jesus, e o contexto deixa
clarividente (vs-13-17). É como se o apóstolo disse assim: entendam que Jesus
morreu por vocês quando vocês ainda eram pecadores, injustos, portanto, vocês
devem suportar o sofrimento e a perseguição desses injustos e pecadores e serem
capazes de evangeliza-los e defender a sua fé (vs-14-15). Percebem que o
propósito é missional e apologético nada tendo a ver como os limites da
expiação.
Terceiro, fica
explicito na retórica do pastor Paulo que ele não entende bem a relação da
realidade históricoteológica da expiação e sua posição dentro da ordem da
salvação (ordus salutis). Que quero afirmar com isso? Que a
expiação para ser eficaz dependerá de outros fatores dentro da superestrutura
da Redenção, ou seja, fé, justificação, regeneração, arrependimento, enfim.
Desse modo, para que homem caído experimente salvadoramente os efeitos da
expiação realizada por Jesus, ele precisa nascer do alto, crer salvificamente,
ser justificado, se arrepender, enfim. A questão é que essas realidades citadas
são resultado de intervenções graciosas
e incondicionais de Deus (Ef 2.8; Hb 12.2, At 11.18; Jo 3.3,5), que por sua
natureza e resultado não serão vivenciadas por toda a raça humana, mas para um
número imensurável, uma quantidade inumerável de indivíduos da raça humana ad
tempora, até a consumação de tudo, tornando irrealizável a expiação
universal.
Quarto lugar, no debate
não foi discutido pelo pastor Paulo uma realidade que precisaria anteceder a própria
discussão sobre os limites da obra expiatória de Cristo que é a pecaminosidade
humana. Qual a condição da humanidade face a oferta da obra expiatória de
Jesus? Eles podem responder a essa oferta, sem uma atuação prelibar divina, a
parte da própria manifestação da obra sacerdotal do messias? Fiquei pasmo, perplexo
de ver o pastor lidar com a resposta humana à expiação como se ela não fosse
ainda caída, como se eles pudessem aceitar essa obra redentora sem nenhuma
atuação previa, prelibar do Espírito, de Deus, chegou ser tocante. Agora qual a
dificuldade com isso? É que a revelação bíblica retrata a humanidade de outra
forma: morta, escravizada, rebelde e idólatra (Ef 2.1-3; Rm 3.9-20,23; Cl
1.13-14; Rm 1.18-32 entre outros ). Portanto, se Deus não alterar radicalmente
essa condição humana, ela jamais poderá experimentar os efeitos salvadores da
expiação. Agora, sobre quem Deus realiza essa obra toda a humanidade? O
trabalho interiorizado e determinante do Espírito fazendo o homem ressuscitar,
reviver (Jo 3.3, 5: genêthê: verbo subjuntivo aoristo passivo, o
home sofre a ação de nascer e esse nascimento é completo) é sobre todos os
homens?
Quinto lugar,
respondendo a se os eleitos podem ser percebidos no texto de Isaias 53.12. Bem,
segundo o entendimento hermenêutico do pastor Paulo ele assevera que muitos (varabim)
seria uma má tradução e que esse adjetivo traria o sentido de abundância, significando
então uma quantidade indeterminada de pessoas, que não se poderia achar ali um
sentido que se aproximasse teologicamente de eleitos. Primeiro, a tradução
muitos é viável, pois, excelentes léxicos traduzem esse adjetivo como: numerosos,
muitos, grande quantidade, enfim. Para exemplificar, o Lexigo Analítico
Hebraico e Caldaico traduz esse termo como: numerosos, grande quantidade,
muitos (Davidson, Benjamim, São Paulo, Vida Nova, 2018, p.973). Porém, a questão
em relevo é se essa expressão pode ser usada teologicamente para descrever os
eleitos. Entendo que sim, visto que essa quantidade numerosa não representa a
totalidade da raça humana, mas um número incomparável de pessoas. Esses muitos teriam
seus pecados expiados (vaavonotam) pela oferta sacrificial do
Servo (Andi), seriam justificados (yatzdik). Outra
coisa esses muitos teriam seus pecados pessoalmente levados (hu yisbol)
pelo Servo por intermédio de seu sacrifício substitutivo. Onde fica essa realidade
abstrata que a expiação ilimitada precisa para se manter como realidade possível?
Outra coisa, toda essa realidade dos muitos descrevem teologicamente o que
cremos acerca dos eleitos. Por conta e fundamentados nisso não haveria nem
óbice de se enxergar ali esses eleito, dentro de um background velho
testamentário da profecia messiânica de Isaias.
Rev. Marcus King
Barbosa- Teólogo Público, Mestre em Psicologia, Doutor em Filosofia, Filósofo
da Subjetividade
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