Pular para o conteúdo principal

Mudanças...

 

Todos estamos presos irremediavelmente a roda-rolante do devir; ou seja, das mudanças que pontilham nossas existências. Um dos primeiros filósofos que compreendeu esse amarramento humano às teias das alterações foi Heráclito ao sinalizar que ninguém toma banho no mesmo rio, isso porque o rio não seria o mesmo, nem tão pouco nós que entramos também seriamos.

De fato, estamos jogados na espiral das transformações sem nenhum tipo de apelação. Essas mudanças que afetam os rumos de nosso existir in toto, são de duas naturezas fundamentais: positivas e negativas. Disso podemos asseverar sem assombro que temos evoluções e involuções. Evoluímos e regredimos mais tudo sob a égide da alteração continua da existência. Ou seja, todos estamos em continuo processo de ressignificação. 

 

MATRIZES PRIMÁRIAS DE NOSSA EVOLUÇÃO EXISTENCIAL

Mas como esses processos evolutivos acontecem nos diâmetros de nossa existência? Quais os agentes eu agenciamentos formativos dessas alterações e avanços que atuam ativamente em nossa caminhada? Pode-se dizer que são nossas relações mais primaz e fundantes, isto é, nossos pais e a nossa família. Note, nossos pais são os grandes promotores de nossas mudanças em todos os sentidos e latitudes. O senso de identidade e significado que eles nos legam hereditária e existencialmente são duradouros. Quem já não lutou com os pais dentro de si? Quem já não os levou para o divã? Os pais contribuem para nosso progresso, no sentido em que são eles que saturam parte relevante de nosso Self, portanto, tendências, emoções e comportamentos que vivenciamos estão saturados de suas presenças. Por isso ao atentarmos as nossas mudanças precisamos levar em contexto o lugar indisputável da família.

 

MATRIZES SECUNDARIAS DE NOSSA EVOLUÇÃO EXISTENCIAL

 

Entretanto, é mais que óbvio que no nosso fiat evolutivo a figura dos pais não é um personagem único. Além deles temos atores significativos, diria inspirativos que contribuem para nossa mudança e agem decisivamente em nossa teia de significados. Estes são professores, líderes religiosos, amigos, artistas, (hoje em nosso tempo midiático) influenciadores, enfim. Todos estes forjam um espectro linear iluminativo para as variadas transformações que passaremos em nossa existência. Agora é claro que essa plêiade não exercerá a mesma função. Alguns serão agentes do caos, do desconforto tentando nos apequenar em nossa jornada.

Portanto, precisamos estar atentos a esses níveis de influência que anseiam nos diminuir e que se dão no terreno estéril das cognições desadaptativas e ciclos viciosos de pensamentos e emoções. É como escreveram Jesse H. Wright, Monica Basco e Michael Thase no livro - Aprendendo Teoria Cognitivo-Comportamental: Cada vez que fazia uma manobra para fugir de situações sociais, suas crenças sobre ser incapaz e vulnerável se fortaleciam. Essas cognições de medo, então, amplificaram seu desconforto emocional e tornaram menos provável que se envolvesse em atividades sociais (Wright, Basco e Thase – 2008, p.17).

 

NOSSA CAPACIDADE DE RESSIGNIFICAÇÃO EM NOSSA EVOLUÇÃO EXISTENCIAL

Aqui chegamos ao ponto modular, cataclísmico de nossas mudanças visto que é nesse lugar que encontramos o verdadeiro significado para nossa evolução existenciária.

Não mudamos em um ângulo que possamos dizer evolutivo apenas pela atuação do legado paterno ou da contribuição dos agentes inspiradores, carecemos de algo mais significativo e pessoal que é de fato o nosso próprio protagonismo reinscritivo e adaptativo.

 Nós somos os devedores de nosso crescimento relacional e existencial. Nós somos o nosso ponto alfha/ômega determinante para o crescimento histórico e temporal enquanto entes nesse mundo e aqui somos sujeitos sem álibi. Não somos vítimas da história, das divindades, dos outros, se o somos apenas de nós mesmos, porque temos o dever inalienável e pétreo de crescermos e evoluirmos nos tornando seres melhores apesar das contingências da própria vida. Penso que foi essa grande sacada de Sartre ao deixar claro que somos responsáveis não pelo que fizeram a nós, mas pelo que fizemos do que fizeram conosco. É aí que subjaz o nosso real compromisso com as mudanças que perpassarão nossas existências inadvertidamente, mas que podem ser de caráter não tão agradável. Portanto, estejamos atentos e vigilantes. SDG.

Dr. Marcus King Barbosa - Psicanalista Clínico, Psicoterapeuta Integratista, Filósofo Existencial e Teólogo Protestante

 

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

The Divine Self-Revelation and the Work of the Reformed Theologian

  Our activity as public theologians fundamentally depends on theological work. This work, in turn, originates from the hermeneutical perception that God communicates with His moral creation made in His image ( imago Dei ), meaning the understanding that God has spoken to His creation. This speaking is obviously mediated ( Vermittelte ); it does not come to us in a literal divine discourse but is instead unveiled, adapted, and contextualized to our condition as creatures, to our essential limits and frailties—namely, understanding, imagination, and perception. As R.C. Sproul explained: God addresses us on our terms, and because He made us in His image, there is an analogy that provides a means of communication with Him (Sproul - 2017).   This means used by God to reveal Himself to His creation is designated by theology as revelation ( g’lâh, apokalypsis, phanêrosis ). Revelation is, therefore, the way God unveils or reveals Himself (epistemology) to His creation in what i...

Jesus o criador

  Cristo como o filho eterno gerado por Deus/Pai é parte de uma relação divina que foi designada na tradição teológica cristã de a trindade, ou triunidade divina. Nessa correlação dentro da ontologia que inclui o Espírito Santo ( Ruash L’Qadosh ) todos possuem a essência divina ( ousia ) distinta em modos de subsistência ou pessoalidade (personas). Esse entendimento foi bem firmado em um símbolo confessional antigo, o credo de Atanásio e inserido dentro do Livro de Concórdia, documento confessional Luterano: E a fé católica consiste em venerar um só Deus na Trindade e a Trindade na unidade, sem confundir as pessoas e sem dividir a substância. Pois uma é a pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo; mas a divindade do Pai, do Filho e do Espírito Santo é uma só –igual em glória, coeterna em majestade (Livro de Concórdia, São Leopoldo, Porto Alegre, Concórdia/Sinodal, 2023). Vemos também essa confissão de uma visão trinitária de Deus em outro credo confessional, A Fé ...

SOMOS UMA GERAÇÃO DIGNA DE LAMENTO

Penso que somos uma geração que até o momento não provamos do poder real do Evangelho da graça. Não me compreendam mal, não estou dizendo que não temos um conhecimento intelectual e teológico   das doutrinas da graça, não estou também afirmando que não temos milagres, conversões, nem tão pouco estou sugerindo que não temos um grande império religioso com nosso templos abarrotados de fieis. Fazer uma declaração assim seria contrario senso, o que estou tentando delinear é que até então somos uma geração espiritualmente pobre de uma verdadeira experiência com o poder da graça do Deus trino como tornada disponível no Evangelho de Cristo (Tt 2.11-13). Você deve estar indagando por que ele diz isso? E tem toda razão de assim fazê-lo visto que essa é uma declaração ousada e comprometedora pelo seu conteúdo. Então por que estou fazendo isso? Bem minha afirmação não é arbitrária, mas resultado de uma reflexão madura e profunda do próprio Evangelho como quando confrontado com a prá...