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Autismo uma olhar


Quando se fala de autismo um mix de sentimento se arvora no indivíduo não especialista. O primeiro deles é o desconhecimento, sim muitos pais, amigos, professores, enfim, vivem em relação ao autismo, uma falta de conhecimento, de informação, não raro sobre o que é mais fundamental que na maioria dos casos impõe um prejuízo enorme, quando não irreversível a criança autista.

O segundo muito próximo do primeiro é o preconceito que concebe o autista como uma criança socialmente indiferente, incapaz de qualquer qualidade de conexão, limitada, diferente, enfim, como bem destacou a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva em seu livro Mundo Singular, a imagem de uma criança isolada em seu próprio mundo, contida numa bolha impenetrável, que brinca de forma estranha, balança o corpo para lá e para cá, alheia a tudo e a todos.Geralmente está associada a alguém "diferente" de nós, que vive à margem da sociedade e tem uma vida extremamente limitada, em que nada faz sentido. Mas não é bem assim. Esse olhar nos parece estreito demais: quando nós falamos em autismo, estamos nos referindo a pessoas com habilidades absolutamente reveladoras, que calam fundo na nossa alma, e nos fazem refletir sobre quem de fato vive alienado. (Silva - 2012).


Psicopatologia – Backgrand do Espectro autista

Essa atitude preconcebida é mais comum infelizmente do que imaginamos, muitas famílias sofrem vitimadas por esse ato fragmentário conectivamente e eivado de sentimentos de ignorancia afetiva e intelectual. Mas para tratar do autismo é necessário antes abordarmos a psicopatologia infantil que é a estrutura dorsal onde está inserido tudo que se pode falar sobre ele. O que é psicopatologia? Ciência que estuda o fenômeno dos transtornos mentais em sua estrutura completa, da forma exata que estes se impõem a experiência concreta e imediata, a partir do relato do afligido. O termo foi cunhado por Jeremy Betham e é a fusão de três vocábulo grego: psiquê – alma, páthos: sofrimento, doença, lógos: palavra, estudos.

Da definição podemos destacar a cientificidade e fenomenologia social que caracteriza a psicopatologia, deixando como recorte o disciplinamento metodológico do fenômeno dos transtornos metais como bem enfatizou o psiquiatra Elie Cheniaux Jr em sua obra sobre a psicopatologia, a psicopatologia e uma disciplina cientifica que estuda a doença mental em seus vários aspectos: suas causas, as alterações estruturais e funcionais relacionadas, os métodos de investigação e suas formas de manifestação (Cheniaux – 2002).


O que é mesmo o espectro autista?

É dentro desse caldeirão cientificista disciplinar que surge o transtorno do espectro autista como uma psicopatologia dentro do desenvolvimento cognitivo caracterizado por deficiencia saliente nas esferas socioafetiva e interação social, além de manter padrões repetitivos de comportamento. O DSM-V no seu critério diagnóstico classificou o espectro autista como A. Déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos (…) B. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (DSM -V – 2015,p.50).

Do que apresenta o DSM-V fica mais que claro que o espectro autista compromete áreas sensíveis para a existencialização. A primeira delas é a interação social, o autista interpreta mal em vários momentos e situações os signos sociais . A segunda é a dificuldade na esfera da comunicação verbal e semiótica. A terceira inabilidade da criança autista é a rigor um desdobramento das duas dificuldades anteriores que é a inadequação comportamental. Na ótica de Ana Beatriz o autismo traz inúmeros prejuízos para várias áreas da existência da criança autista, a principal área prejudicada, e a mais evidente, é a da habilidade social. A dificuldade de interpretar os sinais sociais e as intenções dos outros impede que as pessoas com autismo percebam corretamente algumas situações no ambiente em que vivem. A segunda área comprometida é a da comunicação verbal e não verbal. A terceira é a das inadequações comportamentais. Crianças com autismo apresentam repertório de interesses e atividades restritos e repetitivos (como interessar-se somente por trens, carros, dinossauros etc.), têm dificuldade de lidar com o inesperado e demonstram pouca flexibilidade para mudar as rotinas(Silva - 2012).

O DSM -V descreveu aquilo que caracteriza o padrão unilateral de repetição que contribuem sensivelmente no processo de não-interatilidade social e linguístico este se diferenciam por 1. movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos (p. ex., estereotipias motoras simples, alinhar brinquedos ou girar objetos, ecolalia, frases idiossincráticas).
2. Insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (p. ex., sofrimento extremo em relação a pequenas mudanças, dificuldades com transições, padrões rígidos de pensamento, rituais de saudação,
necessidade de fazer o mesmo caminho ou ingerir os mesmos alimentos diariamente).
3. Interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade ou foco (p. ex., forte apego a ou preocupação com objetos incomuns, interesses excessivamente circunscritos ou perseverativos).
4. Hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente (p. ex., indiferença aparente a dor/temperatura, reação contrária a sons ou texturas específicas, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, fascinação visual por luzes ou movimento)(DSM -V – 2015,p.50).

A partir daqui vamos analisar melhor os tres universos que constituem os desdobramentos desse transtorno: social, linguístico e comportamental.

Universo Social

Tratando da interação social a criança que manifesta o transtorno de espectro autista se notabiliza pela deficiencia na socialização com diferenças de grau e forma, mas não material; ou seja, há crianças autistas que não interagem em sentido algum, outras que essa interatividade é comprometida num sentido muito grave, outras, entretanto, que apresentam inadequações tão imperceptíveis, mesmo para especialistas, dai falarmos de traços de autismo são essas camadas que respondem por muito erro de diagnóstico afirma Ana Beatriz que existem crianças com problemas mais severos, que praticamente se isolam em um mundo impenetrável; outras que não conseguem se socializar com ninguém; e aquelas que apresentam dificuldades muito sutis, quase imperceptíveis para a maioria das pessoas, inclusive para alguns profissionais. Estas últimas apresentam apenas traços do autismo, não fecham diagnóstico, mas suas pequenas dificuldades também devem ser tratadas (Silva – 2012).

Dai não precisa ter uma fabulosa expertise para perceber que esse transitar dos autistas nesses níveis de existir torna-se um tremendo desafio (em algumas situações um verdadeiro pesadelo) para todos que estão diretamente envolvidos com eles. Para ser sincero, a complicação nuclear advém da presença de traços demasiadamente humano da intercomunicação nos autista simplesmente por estes serem humanos normais; isto é, somos seres gregários, desejamos e buscamos a conexão com o semelhante e esse impulso não está desinstalado da subjetividade autista, a questão está na formalização desse impulso, que via de regra acaba sendo insuficiente e infrutuoso gerando crises profundas.

Universo Linguístico (continua no próximo post)

Dr Marcus King Barbosa – Psicanalista Clínico, Filósofo e aprendiz de Discípulo


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